Carta deixa claro que a agência aumentará a fiscalização
e cobrará das rádios o cumprimento de normas que limitam a atuação das
emissoras
A FIFA e seus parceiros comerciais vêm conseguindo impor
seus interesses ao Brasil. A Lei Geral da Copa e a proposta de Lei
Antiterrorismo são mostras de que o poder público tem sido subserviente ao
poder econômico dessas corporações. Mais um caso flagrante disso é a recente
carta (veja a íntegra aqui) que a Anatel enviou às associações de rádios
comunitárias, na qual informa que vai aumentar a repressão por conta da
"Copa do Mundo FIFA".
Todos sabemos que a Lei de Rádios Comunitárias (Lei
9612/98) foi criada para que elas não existam. Das mais de 4.600 rádios
legalizadas no Brasil, 99% podem ser apontadas como infratoras por conta das
armadilhas da lei (isso sem falar nas cerca de 10 mil que esperam há mais de
dez anos pela legalização). Para exercerem o direito humano à comunicação, as
rádios comunitárias são obrigadas a cair na ilegalidade, desde a operação em
outra frequência, já que a referida lei as coloca fora da faixa de FM, até a
veiculação de publicidade do pequeno comércio local, pois não possuem outra
forma de sobrevivência.
Agora, a Anatel quer que as infrações acabem por conta da
Copa do Mundo, sob a alegativa "de utilização intensa do espectro
radioelétrico durante a realização de eventos de grande magnitude",
conforme a carta destinada às rádios. De acordo com o texto, "Para o uso
adequado do espectro de radiofrequência é impreterível o cumprimento das
características técnicas autorizadas para o funcionamento de suas estações,
além da utilização de todos seus equipamentos com a devida
certificação/homologação".
Como a Anatel sabe que essas condições não podem ser
cumpridas pela maior parte das rádios do país, a carta deixa claro que a
agência vai aumentar a perseguição a quem cumpre voluntariamente um papel
fundamental para a sociedade: "Ademais, destacamos que no primeiro
semestre de 2014 as fiscalizações serão reforçadas em todo o Brasil e como de
praxe as entidades atuando em descordo com a regulamentação em vigor por
este órgão serão autuadas". Trata-se de uma criminalização anunciada.
Na Rio+20 foi diferente
A Agência Nacional de Telecomunicações e o Ministério das
Comunicações provavelmente dirão que devem cumprir a lei e pronto. Só que
sabemos que quando há interesse político, a história pode ser diferente. Durante
a Rio+20, em 2012, a Anatel já ensaiava sua atuação para a Copa. Com novos
equipamentos, funcionários chegaram à Rádio Cúpula dos Povos, que funcionava no
Aterro do Flamengo. Neste caso, o automático ato de fechar uma emissora foi
substituído pela alternativa mais sensata: contribuir para a prática do
direito à comunicação.
Buscando a garantia da liberdade de expressão, Ministério
das Comunicações e Empresa Brasil de Comunicação (EBC) aturam e, em 24 horas,
aquela rádio comunitária foi legalizada com a ajuda do poder público. Foram
pelo menos dois os ganhos: a rádio passou a funcionar dentro da legalidade e
o direito humano não foi violado.
Anatel e Ministério devem auxiliar e não reprimir
Atender reivindicações é mais inteligente do que
reprimir. Já passou da hora de o Brasil regulamentar sua Comunicação do
ponto de vista da democracia. Fechar uma rádio comunitária não resolve nada. No
outro dia, mais outras rádios estarão funcionando, porque a população quer
fazer sua própria mídia e não apenas consumir os conteúdos já existentes.
Ao contrário de criminalizar, a ação correta é entender
a importância da comunicação comunitária (como fez Lula no último mês de seu
mandato, ao chamar as rádios para reunião em que reconheceu sua importância
para a democracia e prometeu que no governo Dilma iria cobrar a valorização do
setor) e criar políticas públicas que garantam, dentre outras questões, mais
frequências, financiamento público, mais potência e menos burocracia
(que FHC, Lula e Dilma não fizeram), contribuindo para que esses meios possam
cumprir seu papel de multiplicar as vozes que circulam pelos meios de
comunicação.
Rádio comunitária não é caso de polícia. Rádio
Comunitária é um direito humano!
* Arthur William é integrante do Conselho Diretor do
Intervozes
Em Carta Capital
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